quarta-feira, setembro 27, 2006

Shhh. Não chores pela minha morte. Não gastes lágrimas em sentimentos frágeis com alguém inútil que já nem cá está mais. Prometi que te escrevia uma carta com as lágrimas e as palavras mortas que já só tinha pra te dar. Morri-te. Mas continuo aqui a escrever-nos. A ler outras pessoas que sentem. Quase pareçe que só sabemos ser tristes. Ou que não há sorrisos em nós. Nunca. Todos olham com desprezo. Não sempre. Mas não nos sentem. Não nos sabem. Julgam-nos tanto. Ignoro isso. Eles têm ar de escritor. Oh sim. Ar de escritor. Ar de quem sente. Eu não. Não tenho ar de nada. Já te morri nas minhas palavras em que tudo é silêncio. Continuo a querer que me mintas. Que me mintas para me achar feliz ou menos inútil por assim dizer. Para ter palavras mentirosas deste jogo imaginativo de mentiras. Porque talvez o que sinta é indizível ou as palavras continuam a não querer nada com cadáveres com vida inúteis. Quantas e quantas vezes já referi o quão grande é a minha inutilidáde. Perdi-me em nós e isso faz de mim inútil. Disseram-mo e eu acreditei. Também acredito em gatos das botas. Num gato branco de botas pretas. Que viaja. E sempre que sai vai à lua. Tenho um gato assim. Mas ele continua a esconder as botas. Recebi uma carta ontem ou lá quando foi. Era um convite para uma decapitação. Ainda suspeitei. Mas tive logo a certeza de que quem a tinha escrito era eu contigo cá dentro. Acabei por ignorá-la. Isso aniquilar-me-ia o amanhacer e impedir-me de ver que é Outono, que chove e faz frio. Não me ia lembrar mais de todos os sonhos forjados. Tudo o que não fui. Todas as palavras que não sou ou que não me cabem mais cá dentro. Escapa-se-me o verdadeiro sentido por isso ainda te espero. Talvez um dia isso mude quando eu já não tiver coração ou não tiver de me esconder na sombra do silêncio das minhas palavras. Acabo sempre por te morrer nessa tua ausência.

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