terça-feira, agosto 29, 2006

Arranha-me. Mata-me. Deixa-me ser cobarde e ir. Eu nunca disse que sou forte. E o que eu quero é mesmo para os fracos. Aprendi alguma coisa? As asas não são minhas. Nem as desenhadas na areia ou neve. Escapam-me sempre. Em tanto tempo podia concluir nada. E saber que não existem culpas. Mas. Isto doi-me todos os dias. Falo em mim. Mas evito-me. Não uso um eu. Uso sempre um nós. Nós não fomos nós. Eu é que tentei sempre ver mais além nesta cegueira. E quando por fim vi. Vi alguém pouquissimo importante estragar-me o pouco que tenho. Podia ser eu. Sim sou eu também. Mas também são eles. Eles são fantasmas. Arranharam. Fizeram com que me deixasses. Eu não existo. Culpo-os a eles. Mato-me um pouco todos os dias em que te penso. Ou ignoro o olhar de um recomeçar. Não sei começar mais. O cigarro já vai no fim e eu nem fumo. Continuas a insistir em tê-lo perto do meu coração. Acabo eu queimada no fim. E tu sem cigarro. Há-de haver sempre mais um. Por isso. O fumo não te importa. Mas porra tira-mo. Atira-o para o chão. E pisa por fim esse cigarro cobarde dependente de ti. E deixa-me continuar. Sem precisar de haver mais culpados. Deixa as cicatrizes. A nuvem espessa do fumo algum dia há-de passar. Quando passar espero estar aqui.

quinta-feira, agosto 24, 2006

Se todo o ser ao vento abandonamos
E sem medo nem dó nos destruímos,
Se morremos em tudo o que sentimos
E podemos cantar, é porque estamos
Nus em sangue, embalando a própria dor
Em frente às madrugadas do amor.
Quando a manhã brilhar refloriremos
E a alma possuirá esse esplendor
Prometido nas formas que perdemos.
Aqui, deposta enfim a minha imagem,
Tudo o que é jogo e tudo o que é passagem.
No interior das coisas canto nua.
Aqui livre sou eu — eco da lua
E dos jardins, os gestos recebidos
E o tumulto dos gestos pressentidos
Aqui sou eu em tudo quanto amei.
Não pelo meu ser que só atravessei,
Não pelo meu rumor que só perdi,
Não pelos incertos actos que vivi,
Mas por tudo de quanto ressoei
E em cujo amor de amor me eternizei.


Sophia de Mello Breyner


Há quem não nasça com o dom da felicidade, há quem não nasça com o dom de escrever bem e bonito. Nenhum desses me pertençe. Não que desista de algum, mas, por hoje não escrevo pois nada do que escrevo(ria) sai(ria) perfeito tal como o que ela escreveu. Invejo-lhe as palavras bonitas. E isso não é nada bonito.

quarta-feira, agosto 23, 2006

A vida devia ser mais que uma simples rotina. Consumismo. Materialismo. Sentimentalismo. Deviam ser corações suspensos no ar. O cheiro doce. O colorido. As borboletas. Pensava que era uma. Não sou. Elas vão ser sempre da primavera e do colorido. Elas vão ser sempre da felicidade. Não de pessoas como eu. Com um olhar vazio. Não tenho expressão. E não que me sinta sempre cansada, mas tenho aspecto de quem está sempre cansada. Ou triste. Bem. Isso também não é importante. Acabo sempre por falar em mim. Oh. Sou tão égocentrica. Talvez o suicidio seja demasiado egoista. Ou faça parte de pessoas que desistem ou se odeiam. Não sei. Só não consigo parar de pensar nisso. Já fiquei tantas vezes distante de mim pelos outros e agora tudo o que me surge sou eu, tu, ou ele. Apagava-me. E deixava-vos. Não vos perseguia mais nos meus pensamentos. Deixava de pareçer tão triste ou cansada. Não pareçia mais. Não tinha mais de o ver evitar-me mais e de ouvir esta música triste sempre cá dentro a lembrar-me. . .
Se ao menos não sentisse que perdi a minha vida.
Valeu tudo apena até agora?
Ou simplesmente fui nada?
Certezas?
Apenas uma. Não pertenço aqui.
Nem nunca hei-de pertençer.
A algo que nada me diz.

domingo, agosto 20, 2006

Apaguei tudo. Não podia ler mentiras em que eu queria acreditar. Não que não pudesse algum dia achar que afinal sou suficientemente boa que até 'sirvo' para ti. Não que não achasse que poderias olhar para mim mas não consigo evitar sempre de pensar de que isso é impossivel. E isto tudo torna-se sempre impossivel. Os pensamentos controlam os actos. Todos os actos acabam em tudo menos em algo do que pensamos. Defeitos. Vejo-me repleta deles. Acabo sempre a pensar que as pessoas me julgariam por eles. De facto. Acabamos sempre a fazer isso. A fazer juizos de valor das pessoas. Existirá alguém que não julgue? E que apesar de todos os defeitos e de pequenas virtudes nos aprecie verdadeiramente. E nos aceite. Assim, só como somos. Se algum dia conseguir evitar isto, tirar-te de mim, tirar este péssimismo. E voltar a sorrir. Com um olhar expressivo que reflita esse mesmo sentimento. Não gosto no que me tornei. Distante. Sempre com um mau feitio a que as pessoas chamam personalidade forte. Na verdade, sou demasiado vulnerável e acabo por afastar-me. Ou fico agarrada a pessoas como tu. O que faz odiar-me tanto. E querer-te ainda mais. É sempre confuso. Se nunca tivesse ficado nesta situação não pensaria desta mesma maneira, continuava a não dar importância ao que sinto e não saberia o que sei hoje. Porque o tempo trouxe dor mas também sabedoria.
Olha no que nos tornámos.
No que me tornei.