domingo, agosto 29, 2010
Bem-me-quer!
Fausto:
Conheceste-me, anjo do meu coração,
Quando há pouco no jardim entrei?
Margarida:
Não vistes? Pus logo os olhos no chão.
Fausto:
E perdoas a liberdade que tomei?
E o que se permitiu minha ousadia
Quando da tal catedral saías no outro dia?
Margarida:
Era a primeira vez, fiquei perturbada;
Ninguém tinha nada que me apontar.
E pensei: Será que ele viu no teu andar
Qualquer coisa imprópria ou mais ousada?
Parece que ao primeiro olhar
Uma moça como eu decidiu namorar.
O que me deu, confesso não sei,
Para logo em mim achardes só favor;
Só sei que comigo me zanguei
Por convosco me não poder zangar.
Fausto:
Meu amor!
Margarida:
Posso?
Colhe um malmequer e começa a arrancar as folhas, uma a uma.
Fausto:
Que é isso? Um ramalhete?
Margarida:
É só um jogo.
Fausto:
Qual?
Margarida:
Não troceis! Ide!
Desfollha o malmequer, murmurando.
Fausto:
Que murmuras?
Margarida (a meia voz):
Bem-me-quer, mal-me-quer...
Fausto:
Oh, anjo em figura de mulher!
Margarida (continuando):
Bem-me-quer... mal... bem... mal-me-quer...
(Arrancando a última folha, num grito de pura alegria.)
Bem-me-quer!
Fausto:
Minha vida! É um divino oráculo.
O que essa flor te diz: que ele te quer bem!
Entendes o que isso é, que ele te quer bem?
Pega-lhe nas mãos.
Margarida:
Sinto um calafrio!
Fausto:
Não estremeças! Deixa que este olhar
E o calor desta mão te digam
O que é inefável é:
A entrega total e o sentir
Um êxtase que tem de ser eterno!
Eterno, sim! Seu fim seria desespero.
Um fim não! Não, sem fim!
Margarida aperta-lhe as mãos, liberta-se e foge. Ele fica um momento absorto e depois segue-a.
(Johann W. Goethe, Fausto)
Porque ainda é Domingo, porque não fui dormir, e porque às vezes me apetece exacerbar as paixões. Porque o amor se devia entregar assim simples, caindo como as pétalas da flor, incerto.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário